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Quando analisamos os impactos trazidos pelo COVID-19 no ambiente de trabalho, um dos temas mais discutidos mundialmente é o trabalho remoto. O que vivenciamos hoje, durante a pandemia, não deveria ser enquadrado no conceito tradicional de trabalho remoto, uma vez que diversas variáveis não estão em seu lugar comum. Por exemplo, crianças sem acesso a creches e escolas, funcionários que apoiam alguns lares impedidos de se locomover, restrição de serviços, dentre outros.

Fomos forçados a superar mitos e barreiras limitantes para viabilizar as operações de nossas empresas trabalhando de casa. Esse efeito, segundo especialistas de diferentes fontes, será transformador em escala global. O Gartner Group® publicou recentemente uma pesquisa trazendo os impactos do COVID-19 no futuro do trabalho. Esse estudo aponta que 48% dos trabalhadores passarão a atuar remotamente em suas funções em comparação a uma projeção feita antes da pandemia, que sinalizava um número próximo a 30%.

Outra pesquisa similar entrevistou Diretores(as) Financeiros(as) de empresas globais buscando saber suas visões sobre trabalho remoto pós-pandemia. Um surpreendente número de 74% dos respondentes afirmou que buscará aumentar o trabalho remoto em suas companhias por razões de redução de custo. Os benefícios do trabalho remoto estavam visíveis já no mercado há bastante tempo. Porém, o que impedia um avanço mais rápido nesse sentido eram barreiras culturais e mitos. Esses, por sua vez, foram devastados pela COVID-19.

Agora, um grupo de empresas passa a discutir de que forma e com qual velocidade partirá para o modelo híbrido – determinado percentual remoto e outro presencial – enquanto há aquelas, em menor número, que afirmam operar de forma remota integral a partir da retomada pós COVID-19. Precisaremos acompanhar os próximos passos para entender e avaliar a magnitude dessas mudanças.

Os impactos do trabalho remoto para a Gestão de TI

Para a liderança de TI nas empresas, viabilizar trabalho remoto para funcionários está longe de ser algo novo. Mundo afora, operações globais passaram a depender deste tipo de disponibilidade para suportar crescimento de negócios e internacionalização. Porém, aqui estamos discutindo a intensidade e a velocidade com a qual as mudanças para o trabalho remoto passaram acontecer durante a pandemia e tendem a continuar a acontecer pós COVID-19.

Tomando como base exemplos reais de instituições financeiras de grande porte no Brasil que tiveram que, em questão de dias, viabilizar o trabalho remoto de milhares de colaboradores, podemos ter uma noção do que estamos falando. Empresas que possuíam estratégias de computação em nuvem menos avançada e que tinham baixo uso de plataformas de colaboração foram as que sofreram mais nesse percurso.

A análise aqui, porém, não será focada nos efeitos durante a pandemia, mas no que deve vir a partir do momento que tivermos a adoção das estratégias de trabalho remoto adotadas como regra em larga escala. Listamos cinco impactos e preocupações que devem ser levantadas pelas lideranças de TI para seus grupos diretivos e para o CEO das empresas:

Fonte: Bridge & Co.

1 - Risco de Performance

O trabalho remoto tem sido visto como positivo no prisma do colaborador, que passa a perder menos tempo de deslocamento para o trabalho e aumenta seu potencial de foco e dedicação à empresa. Porém, um lado obscuro não muito discutido trata da qualidade, velocidade e latência de rede que esta pessoa possui em sua residência. No Brasil, sabemos que o acesso à banda larga de qualidade domiciliar é restrito a poucos domicílios em determinados municípios. Mesmo nos centros urbanos das maiores cidades brasileiras, as operadoras de telecomunicações demonstram dificuldade de viabilizar uma rede de alto desempenho estável.

Quando os trabalhadores estão dentro do escritório, cabe ao CIO cuidar da infraestrutura de rede e garantir que o funcionário terá em sua estação de trabalho rede de alta qualidade. E agora, estando em casa, qual será o papel do CIO? Enquanto líderes de negócio, iremos autorizar um colaborador crítico a trabalhar de sua casa de campo, onde há pouca oferta de banda larga, sabendo que ele precisa estar online para funções vitais para a empresa? Dilemas para os quais não temos resposta e que me parecem pouco debatidos, frente ao romantismo do trabalho remoto – principalmente no conceito de “trabalhe de qualquer lugar que você quiser”. Eu recomendaria mudarmos o slogan para “Trabalhe de qualquer lugar que você quiser e que você garanta que a internet irá funcionar!”

2 - Fronteira de Responsabilidade

De quem será a responsabilidade pela contratação do serviço de internet na casa das centenas ou milhares de pessoas que passarão a trabalhar remotamente naquela instituição financeira que citei? Passará então a compor o job description da vaga “ter internet de qualidade? Terá esse requisito o mesmo peso do “inglês fluente”?

Essa pergunta é crucial para discutirmos o futuro do trabalho remoto pós-pandemia. Estando dentro dos escritórios, cabe à liderança de TI projetar, contratar, monitorar e suportar toda infraestrutura de redes e telecomunicações. Ao autorizar o trabalho remoto em massa, perde-se a gestão centralizada da rede e perde-se, principalmente, o controle de sua qualidade e velocidade. Não vejo ainda movimentos de empresas assumindo a responsabilidade e o custo integral de contratação de internet e telefonia para trabalhadores remotos em larga escala. Este, a meu ver, será um dos maiores freios para o movimento de fuga do escritório. Ao que tudo indica, empresas avaliarão cuidadosamente os casos em que estabilidade, desempenho e latência de rede são cruciais, tendendo a mantê-los inicialmente em escritório. Precisamos monitorar o avanço da rede 5G no Brasil e como as cidades e estados irão evoluir em termos de infraestrutura de redes. Tais variáveis têm impacto direto no tópico acima.

3 - Riscos Trabalhistas

Estando nos escritórios, é comum vermos líderes de TI, das áreas administrativas e de recursos humanos, projetando as estações de trabalho. Diversos fatores são levados em consideração, como a ergonomia, impacto em postura, proximidade de telas, dentre outros. Escolhas simples como o tipo de mouse a ser disponibilizado ou o grau de inclinação do teclado podem influenciar nas taxas de absenteísmo por lesões de repetição ou reclamações gerais de dor, tendinite etc.

Se, mesmo dentro dos escritórios, este tema causa controvérsia e envolve constante necessidade de alinhamento entre áreas técnicas e de administração, como faremos isso no modelo de trabalho remoto em larga escala? Teremos nós, líderes empresariais, alcance para dizer o tipo de mobília, cadeira e as distâncias obrigatórias que os colaboradores deverão respeitar estando em suas casas? Perguntas sem resposta para demonstrar que estamos longe ainda de poder afirmar que o trabalho remoto amplo será tão facilmente assimilado como o novo padrão de trabalho.

4 - Segurança da Informação

Este é o tema que gera grande preocupação para grande parte dos líderes de TI. Com grande parte dos colaboradores trabalhando de casa, os perímetros de segurança montados para o trabalho dentro dos escritórios precisarão ser mudados. Preocupações vão desde o tipo de rede que será contratada pelo colaborador ao tipo de hardware que será usado para rotear a internet em sua residência, passando pelo grau de complexidade de senhas a serem definidas, dentre outras.

O cenário de trabalho remoto em larga escala irá provocar uma revolução na área de Segurança da Informação, que já vinha esbarrando com frequência em polêmicas sobre BYOD (bring your own device). Agora, não haverá mais o “B”, dado que o colaborador estará em casa. Passaremos a lidar com o desafio de “UMOD” (using my own device) como regra.

5 - Cultura Organizacional

Por fim, destaco os possíveis impactos em Cultura Organizacional. Trabalho remoto, a meu ver, é algo que foi supervalorizado por aqueles que não o faziam, era bem aceito por aqueles que faziam algumas vezes por semana e passou a ser algo novo e estranho para todos aqueles que tiveram que fazer todos os dias da semana.

Sair do contato físico, do espaço para o café e do almoço em equipe para o distanciamento total não é uma movimentação simples. Os impactos disso para a cultura organizacional, para o clima da empresa e para valores como colaboração, por exemplo, precisam ser monitorados. Aqui, a liderança de TI tem um papel fundamental que é ajudar a viabilizar plataformas de integração e colaboração que ajudem a minimizar os impactos do distanciamento. Um happy hour por videoconferência nunca substituirá o papel do happy hour presencial de uma equipe que acabou de fazer o go live com sucesso de um projeto. Porém, como tudo ainda é novo e incerto, tais ferramentas têm o seu papel a cumprir.

Conclusão

Fazer análises de um cenário que está em transformação não é algo tecnicamente viável nem desejável. Como todas as variáveis dessa grande mudança relacionada ao trabalho remoto estão em constante alteração, trouxe aqui mais provocações do que respostas, para guiar nossos clientes e leitores em suas jornadas decisórias. Contem com o apoio da Bridge & Co. para monitorar as mudanças e apoiar as suas organizações no seu replanejamento. A única certeza é que todos nós precisaremos nos readequar à nova realidade de trabalho, seja ela qual for.

 

Veja também:

[Podcast] Plano de Continuidade de Negócios e Serviços de TI, no contexto COVID-19

Carlos Eduardo Carvalho é Sócio e fundador da Bridge & Co. É mestre em Engenharia de Produção pela COPPE/UFRJ, auditor ISO 20.000, certificado ITIL Expert e CGEIT, entre outras. É professor de pós-graduação em Estratégia e Governança de TI em instituições como UFRJ, UFJF e FGV. Possui experiência em projetos de grande porte de transformação digital, desenho organizacional de áreas de TI e elaboração de processos orçamentários para Tecnologia da Informação.

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